4 em cada 5 profissionais jurídicos estão esgotados: a IA pode ajudar?

12 de novembro de 2025

Quatro em cada cinco profissionais da área jurídica apresentam sinais de burnout. Entenda as causas desse esgotamento, o impacto das tarefas administrativas e de longas jornadas, e como a inteligência artificial pode ajudar a reduzir a sobrecarga e tornar a prática jurídica mais sustentável.


O tamanho do problema, quando o cansaço vira padrão

Existe uma cena que se repete em escritórios de advocacia, departamentos jurídicos e consultorias pelo mundo, com prazos se acumulando, e-mails sem resposta, audiências, reuniões internas, gestão de riscos, relatórios para diretoria e, em algum momento da noite, alguém ainda diante da tela, terminando tarefas que sobraram depois do horário.


O resultado dessa dinâmica não é apenas cansaço, mas um padrão de exaustão crônica que já tem nome, diagnóstico e números preocupantes. Um levantamento recente com 550 profissionais do direito nos Estados Unidos mostrou que quase 80% relataram sentir sintomas de burnout pelo menos algumas vezes no último ano, e uma parcela nada desprezível diz viver nesse estado de forma recorrente. O cenário não aponta para casos isolados, e sim para um problema estrutural que ameaça a saúde mental das equipes e a sustentabilidade do próprio modelo de trabalho na área jurídica.


O que é burnout jurídico e por que encontra terreno fértil no direito

No contexto das profissões jurídicas, burnout não se resume a estar muito atarefado. Trata-se de uma combinação insidiosa de três fatores principais, exaustão emocional profunda, sensação de distanciamento ou cinismo em relação ao trabalho e impressão de que, por mais que se faça, o resultado nunca é suficiente. Advogados, paralegais, assistentes, analistas e líderes jurídicos atuam em ambientes de alta pressão, com riscos relevantes, clientes exigentes, conflitos constantes e, com frequência, pouca previsibilidade em relação à demanda do dia seguinte.


Quando se somam prazos rígidos, cultura de disponibilidade praticamente permanente e estruturas enxutas, forma-se o terreno perfeito para que o esgotamento deixe de ser exceção e se torne a regra. Não surpreende que mais da metade dos profissionais entrevistados tenha admitido já ter pensado seriamente em deixar o cargo ou abandonar a profissão por causa do estresse.


Carga de trabalho, longas jornadas e estruturas enxutas

Por trás das estatísticas desfavoráveis existem fatores bastante concretos. Um dos mais evidentes é o volume de trabalho, associado à extensão das jornadas. Quase metade dos respondentes da pesquisa apontou a combinação de carga excessiva e longas horas como o principal gatilho para o esgotamento, seguida pela percepção de desequilíbrio entre vida pessoal e profissional.


Profissionais autônomos mencionam com frequência a sensação de nunca poder desligar, enquanto advogados internos relatam demandas crescentes com equipes reduzidas e uma fila constante de contratos, pareceres, análises de risco e interações com outras áreas. Em comum, todos descrevem uma rotina em que o dia parece sempre curto em relação a tudo o que se espera deles.


sobrecarga invisível, tarefas administrativas que drenam energia


Um dado chama atenção. Quase 80% dos profissionais jurídicos dizem se ver frequentemente desviados de suas atividades centrais por tarefas administrativas e preparatórias. Agendamento, faturamento, organização de documentos, controle de prazos, digitação de notas, resumo de depoimentos, preenchimento de planilhas e sistemas consomem tempo e energia que poderiam ser dedicados ao trabalho analítico e estratégico.


Não é raro que advogados seniores e sócios admitam gastar muitas horas da semana em atividades que não exigem seu nível de qualificação, mas que alguém precisa executar. E quase ninguém consegue delegar ou terceirizar adequadamente esse tipo de tarefa, já que apenas uma minoria relata conseguir escapar desse fardo de maneira consistente.


Quando o jurídico se aproxima de uma linha de montagem

A consequência prática desse quadro é um círculo vicioso. Quanto mais o tempo é ocupado por tarefas repetitivas e administrativas, menor é o espaço mental disponível para pensar o caso com profundidade, antecipar riscos, conversar com o cliente, estudar teses ou estruturar estratégias de longo prazo.


O trabalho vai perdendo o componente intelectual e humano que o tornava interessante e passa a ser percebido como uma sequência interminável de demandas urgentes. A sensação de não estar entregando o melhor possível se soma à exaustão física e emocional, alimentando ainda mais o burnout e ampliando a sensação de desgaste contínuo.


IA no radar, entre curiosidade e cautela

Nesse cenário, é natural que a inteligência artificial desperte reações ambíguas entre profissionais do direito. De um lado há curiosidade, pois cerca de metade dos respondentes relata algum contato com ferramentas de IA voltadas a tarefas como transcrição, resumo de documentos ou organização de informações.

De outro lado surge cautela, já que muitos manifestam preocupação com a exatidão das respostas, com o risco de erros em contextos em que a margem de falha é mínima e com a proteção de dados sensíveis e do sigilo profissional. Quando o trabalho envolve contratos estratégicos, litígios complexos, dados pessoais ou informações confidenciais de clientes, confiar de forma acrítica em qualquer tecnologia simplesmente não é opção.


O que os profissionais realmente esperam da IA

Chama atenção o fato de que, quando questionados sobre benefícios esperados da IA, muitos profissionais não mencionam apenas eficiência ou produtividade. Uma parcela expressiva aponta de maneira espontânea a redução de estresse, a melhoria do bem-estar e um equilíbrio mais saudável entre trabalho e vida pessoal como ganhos desejáveis.

Em outras palavras, a IA não é vista somente como um recurso para fazer mais em menos tempo, mas como uma possível aliada para trabalhar melhor, com menos desgaste. Tal nuance é relevante, pois o problema central não está na intensidade do trabalho em si, e sim em uma rotina cronicamente desequilibrada, sem autonomia e sem alívio nas tarefas que poderiam ser automatizadas.


O que mostram os dados de quem já utiliza IA no dia a dia

Quando se observa apenas o grupo que já incorpora IA à rotina, os resultados tornam-se reveladores. Mais da metade afirma ter percebido redução nos níveis de estresse e nos sentimentos de esgotamento desde que passou a contar com ferramentas de automação em atividades como transcrição, sumarização, organização de documentos e preparação de materiais.


Há também impacto financeiro mensurável, pois uma parte significativa desses profissionais estima ganhos relevantes de receita ou economia de custos anuais associados à adoção da tecnologia, tanto pela capacidade de atender mais demandas com a mesma equipe quanto pela diminuição de horas desperdiçadas em trabalho manual. Em alguns casos, essa economia projetada alcança valores elevados, especialmente em estruturas que lidam com grande volume de documentos e prazos.


IA não é solução mágica, tecnologia ajuda mas não substitui cultura

Evitar a tentação de tratar a IA como solução milagrosa para um problema complexo e multifatorial torna-se passo indispensável. Burnout envolve cultura organizacional, expectativas pouco realistas, modelos de cobrança, distribuição de trabalho, gestão de pessoas, remuneração, suporte institucional e muitos outros elementos que não se resolvem apenas com software.


A tecnologia pode oferecer, de forma concreta, alívio de parte do peso operacional que hoje recai sobre profissionais altamente qualificados, liberando tempo para o que exige julgamento, criatividade, empatia e responsabilidade. Tal movimento não substitui uma política séria de cuidado com a saúde mental, mas pode compor uma estratégia mais ampla de proteção das pessoas.


Como implementar IA sem transformar ganho de eficiência em mais cobrança


O ponto de inflexão está na forma de implementação da IA. Se a automação for usada apenas para acelerar ainda mais o ritmo, preenchendo o espaço liberado com novas demandas, sem revisão de prioridades, a sensação de esgotamento tende a permanecer. Em cenário oposto, no qual a adoção de IA vem acompanhada de uma decisão clara de reposicionar o papel das pessoas, concentrando profissionais em análise, estratégia, relacionamento e decisões de alto impacto, a tecnologia passa a funcionar como instrumento de proteção da qualidade do trabalho.


Em vez de retirar empregos, a IA assume a parte mais desumana do trabalho jurídico, como o volume repetitivo, a triagem inicial e o preenchimento mecânico de informações, e abre espaço para que a expertise humana se concentre onde realmente faz diferença.


Primeiros passos para usar IA como aliada contra o burnout

Para organizações que desejam avançar nessa direção, o primeiro passo não consiste em escolher a ferramenta em evidência no mercado, e sim em mapear com honestidade onde se concentra o desgaste. É importante identificar quais tarefas poderiam ser automatizadas sem perda de qualidade, em quais etapas se consome mais tempo em atividades que não exigem o olhar de um advogado ou analista experiente e de que maneira os dados estão organizados, ou desorganizados, hoje.


A partir desse diagnóstico, faz sentido testar soluções de IA em processos específicos, com escopo definido, monitorar resultados, ajustar fluxos e, sobretudo, envolver as pessoas diretamente impactadas. A tecnologia só contribui para reduzir burnout quando é percebida como aliada, não como ameaça adicional.


IA como parte da resposta e não como milagre

A mensagem que emerge dos números é clara, quatro em cada cinco profissionais do direito já se sentiram esgotados recentemente e mais da metade já pensou em desistir da carreira por esse motivo. Ao mesmo tempo, os sinais de que a IA pode aliviar parte dessa pressão começam a aparecer com mais nitidez entre quem já utiliza a tecnologia na prática.


Entre o risco de negar o avanço tecnológico por medo e o equívoco de abraçá-lo como solução mágica, existe um caminho mais equilibrado, no qual a IA é vista como ferramenta para redesenhar rotinas, devolver tempo ao pensamento jurídico e tornar a prática mais sustentável para escritórios, empresas e, principalmente, para as pessoas que desejam continuar atuando no direito sem pagar esse preço permanente em saúde e qualidade de vida.



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